quarta-feira, 25 de março de 2009

OS ARQUIVOS DO SUBMUNDO

O delegado me ligou hoje e disse que havia juntado as informações. Ele as mandou para minha casa, por meio de um motoboy. As pastas sobre os casos eram finas, mas não fiquei nada surpreso com isso. Não esperava um grande trabalho de investigação sobre a vida de duas mulheres pobres. Almocei, fiz uma grande jarra de café e me sentei para analisar os documentos na mesa da sala.

Decidi começar pelo caso de Júlia. Abri a pasta e me veio o passado. Tenho muita experiência em analisar informações, passei toda minha vida profissional fazendo isso. Sempre fui bom em juntar pedaços de relatórios e montar um cenário para meus superiores. Quando fui subindo de graduação tive que observar, além dos relatórios, as pessoas. Ouvia tudo,não revelava nada.


Quando me concentrei na pasta, mergulhei no universo particular de Júlia. Foi como olhar sua vida em um microscópio, fria e duramente. Ela tinha 23 anos. A garota não era do nordeste e tinha nascido em São Paulo, em um bairro da região norte. Tinha os pais vivos e eles moravam na Aclimação. Os policiais os procuraram, mas eles não sabiam dela fazia uns dois anos, segundo o relatório dos investigadores. Ela havia saído de casa e nunca mais deu notícias. Os policiais foram falar com uma colega de trabalho dela, no supermercado. A amiga declarou que Júlia tinha um namorado e que eles haviam brigado pouco antes de ela sumir. Os policiais o entrevistaram, um mecânico que trabalha em uma oficina aqui do centro. Ele apresentou um álibi convincente para os policiais e não foi mais incomodado. Desde então o caso está aberto, mas vai prescrever antes que alguém na polícia faça algo mais para investigar, principalmente sem ninguém reclamar.

Fechei a pasta de Julia e me levantei. De repente ela era uma garota diferente. Mais nova do que eu imaginava e com história mais perturbada. Fui até a janela e observei um desses mendigos que dormem na rua, protegido pela marquise. Onde ele havia errado e acabado na rua? Ou será que não era sua culpa?

Fumei um cigarro e fui olhar o outro caso, o da mulher morta em 2007. O assassinato aconteceu em julho, de certo um dia frio. A mulher tinha 34 anos e era prostituta perto da Praça de Sé. Ela morava em um cortiço nas redondezas até que um homem entrou no prédio e a seqüestrou. Os vizinhos ouviram a gritaria, mas não se meteram. O homem, descrito como de estatura média e moreno, a colocou dentro de um carro e os dois desapareceram na noite. Ela ficou sumida por quase um mês até que uma forte chuva revelou seu corpo, que estava enterrado no extremo da zona leste de São Paulo. O corpo foi identificado, mas o assassino não.

A história das duas era parecida, mas Julia não era prostituta. A mulher morta, segundo a ficha, era viciada em drogas e pode ter sido morta por vários motivos. Mas talvez tenha sido o mesmo homem, treinando e adquirindo experiência. Talvez caçando fora de padrão, procurando algo novo, mais sórdido. No caso de Júlia, o assassino poderia estar rondando a região e simplesmente se deparado com ela. Com alguns dias de vigilância ele podia realizar o seqüestro. O rapto foi bem organizado, por isso ele deve ter entrado e conhecido o prédio antes. De certo, algum vizinho descuidado o deixou entrar. Mas o mais difícil não é imaginar o como, mas o porquê. O que ele teria visto na garota?

Essa pergunta fica para depois. Primeiro tenho que ter certeza que o namorado não a matou. Não posso descartar essa possibilidade, pois a maioria dos assassinatos é pessoal. Se Júlia e o namorado tivessem brigado, havia um motivo para o crime. Decidi recomeçar as investigações pela colega de Júlia no supermercado.

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