quinta-feira, 2 de julho de 2009

REVELAÇÕES

A vida de Ana, como filha abnegada, era um embuste. Ela sempre foi uma prisioneira, escrava dos desejos do pai. Para disfarçar sua ausência, o velho contou aos seus conhecidos que ela tinha ido estudar no exterior. Enquanto todos achavam que estava na Europa, na verdade, envelhecia trancada dentro do seu quarto, sem a possibilidade de resgate.

Eu perguntei: - O que mais você fez a ela, além de prendê-la? Conte-me dos estupros.

O velho calou, afastando o rosto da luz, protegendo-o na escuridão do quarto. Eu imaginava que o cárcere não era a única pena que Fritz empunha a sua filha, porém seu silêncio confirmava meus piores temores. Mas eu queria ouvir, eu precisava ouvir. Insisti: - Confesse, Fritz. Eu sei o que você fez com Ana todos esses anos.

O velho respondeu secamente: - Não sabe de nada e não entende nada. Só eu e Ana sabemos o que aconteceu nos anos em que ela ficou comigo, em que eu cuidei dela. Acredite no que quiser, seu doente. Me mate se quiser, porém essa é a verdade.

As palavras de Fritz me fizeram entender. Jamais confessaria, mesmo que eu o torturasse. Ele preferia morrer, antes de revelar a sua verdadeira face. Antes de tudo era um narcisista, pensava na sua imagem. O velho podia viver com o cárcere, mas não com o incesto. Ele não confessaria, porém Ana ainda poderia revelar o final da história. Mas não esta noite.

Vesti minhas roupas e sai do hospital. Deixei o velho vivo, sozinho com seus arrependimentos. Rondei o resto da noite por Assunção, tentando entender. Mas será que alguém como Fritz poderia ser compreendido? Infelizmente, não. O ser humano nunca encontrará a razão do mal. Liguei para Benites pela manhã, acordando-o. Combinei encontrá-lo no hotel Granados para um café da manhã. Ele pagou o café e me levou de volta a San Bernardino. Durante a viagem me perguntou se eu gostaria de adiar a missão na Bolívia. Apesar do braço quebrado, disse que não desistiria. Aquilo era só um contratempo. O coronel indagou sobre a colisão. Respondi, friamente: - Foi mais um dos acidentes da vida. E ela parece ser cheia deles, sem motivo algum.

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